quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

A Soberania de Deus na Salvação

Valdeci da Silva Santos
Fides Reformata

(...) A tradição reformada defende o ensino bíblico da soberania de Deus na salvação do pecador. Talvez o assunto mais contestado da fé reformada seja a sua posição sobre a doutrina da salvação. Os cinco pontos do calvinismo, representados pelo acróstico TULIP, são, para alguns, apenas uma formulação silogista e biblicamente inconsistente. Para outros, todavia, eles representam a essência da fé reformada. O fato é que essa apresentação resumida (cujo acróstico só faz sentido na língua inglesa) é apenas um resumo da soteriologia encontrada nas Escrituas. Esses cinco pontos afirmados pelo Sínodo de Dort, como resposta ao protesto dos arminianos, simplesmente exprimem a verdade bíblica de que “ao Senhor pertence a salvação” (Jn 2.9). Em outras palavras, os calvinistas procuram sustentar a verdade bíblica de que a salvação do homem, morto em seus delitos e pecados, é obra da soberana graça de Deus do início ao fim. Devido à realidade da condição espiritual do homem, sua salvação é totalmente dependente da iniciativa soberana e livre de Deus, “pois não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia” (Rm 9.16).

A Bíblia, na perspectiva reformada, apresenta a salvação do pecador tendo início na decisão soberana de Deus em escolher alguns para a redenção desde a eternidade. Como corretamente expressa Hodges, “passagens como Atos 13.48, Romanos 8.28-39 e Efésios 1.3-14 tornam inpossível, para qualquer um que sustenta a autoridade das Escirturas, ignorar a doutrina da eleição”. Diante dessa impossibilidade, algumas tradições teológicas reinterpretam essa doutrina bíblica afirmando que a eleição é baseada na presciência divina sobre a fé e o arrependimento do indivíduo, tornando assim a salvação totalmente dependente da vontade humana e reduzindo a escolha soberana de Deus a uma condição supérflua. A perspectiva calvinista, porém, não nega a importância da fé e do arrependimento, mas sustenta que ambos são frutos da eleição, pois esta precede aqueles. Além do mais, a Bíblia apresenta a fé como “dom de Deus” (Ef 2.8) e o arrependimento como sendo resultado direto da bondade de Deus (Rm 2.4). Logo, Deus é quem toma a iniciativa de se relacionar com um povo específico através de um pacto eterno em Cristo Jesus. Quando corretamente compreendida, esta verdade produz humildade genuína (1Co 1.26-29), adoração verdadeira (Ef 1.3-6) e motivação à santidade (2Ts 2.13-14), pois o pecador se conscientiza de que a sua redenção é obra da livre graça de Deus,
que o amou a despeito de sua pecaminosidade.

Sendo a salvação um ato da soberana graça de Deus, o pecador pode regozijar-se na certeza de que ela é uma realidade segura nos céus. O próprio redimido é unido a Cristo e “em Cristo” Deus o vê, o aceita e o abençoa (cf. Rm 8.1-2; 1Co 1.4-5, 30; etc.). A fonte da perseverança do cristão é a própria fidelidade e perseverança de Deus. Logo, a certeza da salvação "não é uma simples ersuasão conjectural e provável, fundada numa esperança falha, mas uma segurança infalível da fé, fundada na divina verdade das promessas de salvação, na evidência interna daquelas graças nas quais essas promesas são feitas, no testemunho do Espírito de adoção que testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus".

Longe de ser um incentivo ao pecado e à licenciosidade, essa convicção deve conduzir o cristão à busca diária de um viver santo e reto na presença de Deus e dos homens, pois "é dever de cada um ser diligente em tornar certas sua vocação e eleição, a fim de que, por esse modo, seja o seu coração, no Espírito Santo, dilatado em paz e deleite, em amor e gratidão para com Deus, no vigor e elegria, nos deveres da obediência, que são os frutos próprios dessa segurança".

O texto publicado acima faz parte do ensaio "Quem é realmente Reformado? Relembrando Conceitos Básicos da Fé Reformada" publicado na revista Fides Reformata -http://www.mackenzie.br/fileadmin/Mantenedora/CPAJ/revista/VOLUME_XI__2006__2/Valdeci.pdf

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